quarta-feira, 24 de outubro de 2012

lançamento


MANUAL DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DEMOCRÁTICA



O último lançamento da Saberes Editora foi o livro Manual de Administração Pública Democrática, da autora Valéria Alpino Bigonha Salgado. Colocamos aqui a introdução do livro para despertar o interesse de vocês!

A crise de nacionalidade da economia e do direito, determinada pelo entrelaçamento entre direitos, interesses e procedimentos, em face da inter-relação de economias, tem alterado os conceitos de governança e de governabilidade. O fato de os ordenamentos jurídicos não poderem mais ser enquadrados apenas no âmbito do Estado, nem tampouco serem entendidos como sua mera extensão, tem forçado os Estados a reajustar seus paradigmas internos à nova ordem internacional. Alerta Sabino Cassesse (2010) que, se antes, a economia devia levar em conta o Estado, no cenário globalizado atual, é o Estado que deve considerar a economia. Se, antes, o Estado era detentor de poder absoluto, agora, o seu poder é relativo, mitigado por poderes supranacionais. Os desafios estatais, portanto, não mais se restringem a garantir a unidade do poder público no contexto interno, mas também implicam perda de soberania em relação ao ambiente externo, internacional. A capacidade estatal de participar das estruturas de planejamento e controle globais e das transações de mercado entre Estados e empresas mostra-se fundamental. Como também é de grande relevância a capacidade de atuar sob os novos formatos de colaboração e redes de produção.

No processo de reforma da gestão pública, são várias as fronteiras a ultrapassar. Trata-se de um processo gradual e que deve ser compreendido como um conjunto de pequenas reformas. A capacidade de regulação do mercado ou da área social é apenas uma delas, embora os últimos acontecimentos tenham provado ser ela essencialmente estratégica. Nesse contexto, reafirma-se a importância do tema gestão pública na agenda política dos governos, especialmente nos países emergentes, direcionado à preocupação para a capacidade institucional do Estado de prover políticas públicas e promover a inclusão social, em um ambiente de participação e diálogo democráticos. No Brasil, a reflexão é oportuna, principalmente quando considerados os impactos do estágio atual do processo de redemocratização sobre a dimensão da gestão pública. O amadurecimento do exercício político no País, retomado nos últimos vinte anos, tem se consubstanciado na aproximação dos discursos dos partidos de oposição e na convergência das agendas de governo para um conteúdo de caráter suprapartidário, que se caracteriza pelo objetivo comum de implantar um modelo nacional de desenvolvimento socialmente justo, inclusivo e compatível com a economia brasileira.
No plano social, observa-se o surgimento de um direito social definido a partir do contrato social constitucional de 1988, que concedeu primazia aos direitos fundamentais e sociais e operou, na sociedade brasileira, a transição da carência para o direito, ainda que essa transição tenha alcançado mais êxito no plano teórico do que no real.
O ponto decisivo da transição que se iniciou com a nova Carta constitucional enseja radical alteração nos papéis do Estado brasileiro, das forças de mercado e de grupos de interesses que atuam na regulação dos mercados. De forma mais específica, pode- se dizer que houve o reforço do peso relativo das instituições
e dos arranjos institucionais extramercado (ALVATER, 1993), notadamente das agências estatais e da sociedade civil organizada.
Essa transição regulatória trouxe implicações decisivas para o desenho das políticas e para a gestão governamental, visto que os aspectos da concertação de interesses por meio de arranjos tipicamente
neocorporativos passaram a competir com as formas clientelistas, corporativos tradicionais e burocrático- autoritárias, no processo de formulação e implementação de políticas públicas sociais e para o mercado.
Após mais de quarenta anos de Decreto-Lei n. 200, de 1967, e uma sucessão de medidas de modernização e reforma administrativas iniciadas e não completamente concluídas, a Administração Pública brasileira enfrenta o paradoxo de conviver com práticas patrimonialistas, burocráticas e gerenciais. A coexistência de setores de visão feudal, com procedimentos inadequados, ao lado de áreas que funcionam a partir de uma visão moderna, com métodos gerenciais inovadores, exige o desenho de estratégias diferenciadas de ação, adequadas para cada um desses contextos.
De forma geral, a máquina pública encontra-se desaparelhada e orientada por marcos legais e normativos obsoletos, muitos deles desalinhados em relação a dispositivos constitucionais, alguns ainda não regulamentados, situação que a submete a um risco excessivamente alto de judicialização e, de forma contraditória, estimula uma lógica de escapismo da legislação vigente.
A promulgação da Constituição Federal de 1988, cujo núcleo essencial é a defesa dos direitos individuais e sociais, não foi acompanhada do necessário aporte tecnológico para habilitar o Estado a implantar políticas sociais, assim como realizar a gestão de uma Administração Pública complexa, com relações crescentes de
parceria com o mercado e com o terceiro setor, em um ambiente de participação democrática. A ampliação do aparelho estatal, no modelo de ação descentralizada, com baixo investimento na profissionalização da burocracia e uso intensivo do instituto da terceirização, resultou em perda das capacidades de execução e de coordenação central, gerando fragmentação e descontrole internos. Descentralizar atividades, para dentro ou para fora do setor público, pressupõe supervisão e controle. A atuação em rede, própria de ambientes complexos, em que interagem atores públicos, sociais e do mercado, requer competências de coordenação e controle primário das instituições, de forma a garantir o alinhamento aos macro-objetivos de governo e às políticas públicas setoriais.
No processo de reforma da gestão pública brasileira, são várias as fronteiras a ultrapassar. Trata-se de processo gradual, que deve ser compreendido como um conjunto de pequenas reformas. A capacidade de regulação do mercado ou da área social é apenas uma delas, embora a crise financeira há pouco vivenciada tenha provado ser ela essencialmente estratégica.

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